JOGOS PARALÍMPICOS: A FESTA DA INCLUSÃO ESPORTIVA.

FEA Sports Business
9 min readAug 28, 2024

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No dia 28 de agosto de 2024, teve início mais uma edição dos Jogos Paralímpicos, desta vez em Paris (FRA). Aproximadamente 4.400 atletas proporcionaram lindas, inspiradoras e marcantes histórias de superação, ligadas à vida e à celebração esportiva. Neste texto, você conhecerá um pouco mais sobre a história das Paralimpíadas e os grandes atletas brasileiros que se destacaram nessa grande celebração, sobretudo da inclusão.

Escrito por William Soares

Os Jogos Paralímpicos ocorrem desde 1960, originando-se de uma evolução de competições esportivas para veteranos de guerra com lesões na medula espinhal, iniciadas em 1948, no Reino Unido, pelo Dr. Ludwig Guttmann, um famoso neurologista alemão, considerado o pai do esporte paralímpico. A partir de 1960, em Roma (ITA), as Paralimpíadas se tornaram um evento internacional, ocorrendo a cada quatro anos, imediatamente após os Jogos Olímpicos, na mesma cidade-sede.

Em sua 17ª edição, os Jogos Paralímpicos teve Paris (FRA) como cenário para novas histórias serem construídas, hegemonias serem consolidadas ou quebradas, novos ídolos do esporte paralímpico surgirem e o espírito paralímpico ecoar cada vez mais forte.

Os jogos tiveram início no dia 28 de agosto de 2024 e se estenderão até 8 de setembro de 2024, sendo 11 dias de intensa vivência tanto para espectadores quanto para atletas, com 549 eventos disputados em 19 locais diferentes. Do ponto de vista jornalístico, foram esperados 3.000 jornalistas do mundo inteiro, 278 guias credenciados e o acompanhamento de 34 milhões de pessoas das competições.

Arco do Triunfo com o logo dos Jogos Paralímpicos em Paris. (Foto: Foto: Glenn Gervot/AFP)

Vale lembrar que as Paralimpíadas proporcionam a chance para atletas com deficiências físicas (como amputações, paraplegia, tetraplegia, hemiplegia, paralisia cerebral, nanismo, entre outras), deficiências visuais e deficiências intelectuais competirem em busca do cobiçado ouro paralímpico, além de inspirarem milhares de pessoas ao redor do mundo.

O Brasil foi representado na competição por 280 atletas, sendo 255 com deficiência, em 20 modalidades, entre as quais estão Atletismo, Badminton, Bocha, Goalball, Remo, Natação e Vôlei Sentado, entre outras. Os (as) atletas brasileiros competiram em 8 das 22 modalidades esportivas das Paralimpíadas de Paris 2024. Nossos atletas são considerados parte de uma das federações com melhores resultados na competição, tendo conquistado 72 medalhas em Tóquio 2020 (realizada em 2021), sendo 22 delas de ouro. Esse sucesso é resultado do árduo preparo dos atletas, que competem no mais alto nível. Ao longo das 16 edições completas dos Jogos, o Brasil tem a honra e o orgulho de contar com atletas históricos, lendas e novas promessas que surgiram no meio paralímpico. O intuito principal deste texto é destacar aqueles que tão bem honraram e honram as cores verde e amarela.

Daniel Dias

Aos 33 anos, Daniel Dias é o maior nome da história do esporte paralímpico brasileiro. Seus feitos na natação são incomparáveis, superando qualquer outro esportista do Brasil, com ou sem deficiência. São 27 medalhas em Paralimpíadas: 14 ouros, 7 pratas e 6 bronzes, além de outros 40 pódios em Mundiais, sendo 31 deles dourados. Em Jogos Parapan-americanos, disputou 33 provas e venceu todas. Mesmo assim, os louros não o satisfazem plenamente, pois ele faz parte de uma categoria de atletas paralímpicos que, quando comparados aos convencionais, ficam em segundo plano. “Se eu fosse um atleta olímpico, você imagina o reconhecimento que eu teria?”, diz ele durante entrevista por videoconferência ao EL PAÍS.

Daniel Dias com seus 3 bronzes em Tóquio 2020. (Foto: Reprodução/Facebook/@danieldias)

Dias nasceu em 24 de maio de 1988, em Campinas (SP), com uma má-formação congênita dos membros superiores, perna direita e pé esquerdo. Aos 3 anos, passou por uma cirurgia para poder usar uma prótese e começou a andar.

Quem vê tantas conquistas pode pensar que ele começou cedo na natação, mas sua trajetória no esporte iniciou-se quando ele assistiu à Paralimpíada de Atenas, em 2004, e conheceu o esporte adaptado, ao ver o nadador Clodoaldo Silva conquistar 6 ouros para o Brasil. Até então, Daniel praticava esportes na escola, como futebol e basquete, mas não sabia da possibilidade de competir.

Quando chegou à Associação Desportiva para Deficientes Físicos (ADD) em São Paulo (SP) para começar a treinar, Dias estava interessado em praticar basquete, mas, após avaliação, os professores perceberam que seu talento seria melhor aproveitado nas piscinas. O tempo mostrou que os treinadores estavam mais que certos. O atleta aprendeu a nadar em apenas 8 aulas e já saiu campeão na primeira competição em que participou.

Daniel Dias compete nas categorias S5, SM5 e SB5. Nessa classificação de paraesportes, as letras indicam a modalidade: “S” se refere a swimming (nado, em inglês), “B” vem de breaststroke (nado peito), e “M” de medley (medley). O número indica o grau de limitação: de 1 a 10, sendo que, quanto menor o número, mais grave a deficiência.

Em 2014, o nadador fundou o Instituto Daniel Dias em Bragança Paulista (SP), para usar o esporte como ferramenta de inclusão social.

Terezinha Guilhermina

Terezinha Guilhermina nasceu em 3 de outubro de 1978, em Betim (MG), com retinose pigmentar, uma doença que provoca a perda gradual da visão. Ela cresceu em uma família humilde com doze irmãos, cinco dos quais também tinham deficiência visual. Perdendo completamente a visão na juventude, Terezinha tornou-se a velocista paralímpica mais rápida do mundo, um exemplo de heroísmo e superação.

Aos 16 anos, um exame na Santa Casa de Betim revelou que ela tinha apenas 5% de visão e que perderia a visão por completo com o tempo. Apesar do choque, Terezinha não se deixou desanimar e continuou a buscar oportunidades para superar as dificuldades da vida.

Em 2000, ela descobriu o atletismo ao se inscrever em um projeto da prefeitura de Betim que oferecia esportes para pessoas com deficiência. Inicialmente, ela se inscreveu para natação, pois já tinha um maiô, mas sua verdadeira paixão era o atletismo. Sua irmã Evania deu-lhe um tênis usado, o primeiro da carreira de Terezinha. Ela participou de sua primeira corrida para deficientes visuais e terminou com um pé descalço devido à má qualidade do tênis, mas logo ficou em segundo lugar em uma corrida de rua, ganhando R$80,00.

Em 2001, Terezinha foi convocada para o Pan-americano na Carolina do Sul (EUA), representando a seleção brasileira. Nessa competição, ela conquistou três medalhas de prata na categoria T12, para atletas com alguma visão.

Entre suas principais conquistas, destacam-se:

  • Medalha de ouro nos 100m rasos, 200m rasos, 400m rasos e 4x400m rasos no Parapanamericano da IBSA em São Paulo, 2005.
  • Medalha de ouro e recorde mundial nos 100m rasos, medalha de ouro nos 200m e 400m rasos no Mundial da IBSA em São Paulo, 2007.
  • Medalha de ouro nos 100m e 200m rasos e medalha de prata nos 400m rasos, com novo recorde mundial na Parapan Rio, 2007.
  • Medalha de ouro nos 100m e 200m rasos e medalha de prata nos 400m rasos nas Olimpíadas de Londres, Reino Unido, 2012.
  • Medalha de ouro nos 400m rasos na Golden League IAAF em Paris, França, 2008.
Terezinha Guilhermina com a sua medalha de ouro em Londres 2012. (Imagem: Buda Mendes/CPB/Divulgação)

Em 2004, Terezinha conquistou o bronze nos 400 metros nas Paralimpíadas de Atenas. Como sua visão continuou a se deteriorar, ela passou para a categoria T11, para atletas completamente cegos.

Além de suas conquistas esportivas, Terezinha também se envolveu em diversas atividades fora das pistas. Ela é ativa em campanhas de conscientização sobre deficiência visual e inclusão social e trabalha como mentora para jovens atletas. Em 2021, foi eleita para o Comitê Paralímpico Brasileiro, contribuindo para a melhoria das condições e oportunidades para atletas paralímpicos no Brasil. Seu trabalho e legado continuam a inspirar muitos no Brasil e no mundo.

Claudia Santos

Cláudia Cícero dos Santos Sabino nasceu em 4 de agosto de 1977, em Carapicuíba, São Paulo. Em 2000, sofreu um acidente de trânsito na Rodovia Raposo Tavares, quando saía do trabalho, o que resultou na amputação total de sua perna direita.

Em 2005, Cláudia começou a praticar natação e, dois anos depois, em 2007, aos 29 anos, conheceu o remo adaptado. Surpreendentemente, após apenas oito meses de treino, participou do Mundial de Munique, onde conquistou a medalha de ouro.

Principais Conquistas:

  • Ouro no Mundial de Munique 2007: Conquista significativa após pouco tempo de treinamento em remo.
  • Ouro no Mundial Indoor de Boston 2012: Destaque importante em sua carreira no remo.
  • Prata no Mundial da Nova Zelândia 2010: Outra importante conquista internacional.
  • Bronze no Mundial da Coreia do Sul 2013: Continuação de seu sucesso em competições mundiais.
  • Ouro no Campeonato Brasileiro de Paracanoagem 2018: Título nacional importante em sua carreira.

Em outubro de 2021, Cláudia passou por uma extensa cirurgia para substituir a tela abdominal. Em novembro de 2022, teve que remover a tela devido a uma infecção crônica. Após um período de recuperação, ela retornou aos treinos no final de fevereiro de 2023, mas sofreu um AVC pouco depois. Mesmo com esses desafios, voltou aos treinos intensivamente em abril de 2023, visando o Campeonato Brasileiro que ocorreu em junho de 2023. Durante esse período, ela teve um afastamento médico de 22 dias para exames.

Cláudia tornou-se a primeira atleta brasileira a garantir uma vaga nos Jogos Paralímpicos de Paris 2024. Ela conquistou a vaga ao vencer a final B no PR1 1xW e alcançar o sétimo lugar geral no Campeonato Mundial de Belgrado, na Sérvia, uma conquista notável, considerando o longo período de afastamento do esporte.

Cláudia Santos: 3ª Paralimpíada no ASW1x (Foto: Mpix/CPB)

Portanto, as Paralimpíadas representam não apenas uma celebração do esporte, mas também um poderoso símbolo de inclusão e superação. Desde sua origem em 1960, os Jogos têm evoluído para se tornarem um dos maiores eventos esportivos do mundo, proporcionando uma plataforma onde atletas com diversos tipos de deficiência podem demonstrar suas habilidades e inspirar milhões. Ao longo das edições, o Brasil se destacou como uma potência paralímpica, produzindo ícones como Daniel Dias, Terezinha Guilhermina e Cláudia Santos, cujas histórias de perseverança e sucesso ressoam além das competições. Em Paris 2024, novos capítulos serão escritos, reforçando o impacto transformador das Paralimpíadas na sociedade e consolidando ainda mais o espírito de inclusão que move esse grandioso evento.

Bônus: Campanha brasileira em Paris 2024.

Com o encerramento dos jogos no dia 08 de setembro, o Brasil concluiu sua participação nos jogos olímpicos com 89 medalhas no total, sendo 25 medalhas de ouro, 26 de prata e 38 de bronze; o que configurou a melhor campanha da história da delegação brasileira nos Jogos Paralímpicos.

Para efeito de comparação, a melhor campanha brasileira nas Paralimpíadas foi em Tóquio 2020, com 22 ouros e 72 medalhas no total, fechando na sétima colocação. E em Londres 2012, a delegação nacional também tinha fechado na sétima posição, mas com 21 ouros e 47 medalhas no total, isso mostra o crescimento a cada edição de jogos, consolidando cada vez mais o Brasil como uma potência paralímpica.

Top 5 do quadro de medalhas dos Jogos Paralímpicos de Paris 2024. (Fonte: ge.globo)

REFERENCIAS:

1. BRASIL. Fundação Cultural Palmares. Terezinha Guilhermina: a atleta cega mais rápida do mundo. Disponível em: https://www.gov.br/palmares/pt-br/assuntos/noticias/terezinha-guilhermina-a-atleta-cega-mais-rapida-do-mundo . Acesso em: 18 ago. 2024.

2. COMITÊ PARALÍMPICO BRASILEIRO. Claudia Cicero dos Santos Sabino. Disponível em: https://cpb.org.br/atletas/claudia-cicero-santos/ . Acesso em: 18 ago. 2024.

3. WIKIPEDIA. Cláudia Cícero Santos. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Cl%C3%A1udia_C%C3%ADcero_Santos . Acesso em: 18 ago. 2024.

4. DIGIO. Jogos Paralímpicos Paris 2024. Disponível em: https://www.digio.com.br/blog/meu-digio/jogos-paralimpicos-paris-2024/ . Acesso em: 24 ago. 2024.

5. EL PAÍS. Sir Ludwig Guttmann: o pai do movimento paralímpico. Disponível em: https://brasil.elpais.com/esportes/jogos-olimpicos/2021-08-24/sir-ludwig-guttmann-o-pai-do-movimento-paralimpico.html . Acesso em: 24 ago. 2024.

6. TOQ DILETRA. Do iogurte aos recordes: os caminhos de Terezinha, a cega mais rápida do mundo. Disponível em: https://toqdiletra.blogspot.com/2016/09/do-iogurte-aos-recordes-os-caminhos-de-terezinha-a-cega-mais-rapida-do-mundo.html . Acesso em: 24 ago. 2024.

GLOBO ESPORTE. Quadro de medalhas — Paralimpíadas de Paris 2024. Disponível em: https://ge.globo.com/paralimpiadas/quadro-de-medalhas-paralimpiadas-paris-2024/. Acesso em: 8 set. 2024.

GLOBO ESPORTE. Brasil bate recordes e termina no top 5 do quadro de medalhas das Paralimpíadas pela primeira vez. Disponível em: https://ge.globo.com/paralimpiadas/noticia/2024/09/08/brasil-bate-recordes-e-termina-no-top-5-do-quadro-de-medalhas-das-paralimpiadas-pela-primeira-vez.ghtml. Acesso em: 8 set. 2024.

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