LIVESTREAM: A PROFISSÃO DO FUTURO?

FEA Sports Business
9 min readJul 4, 2021

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Surgimento, crescimento, relevância na atualidade e complicações associadas às livestreams.

Por Danilo Resca, Isabelly Menezes, Luan Freitas, Lucas Macedo e Thiago Abe.

COMEÇO E EXPANSÃO

Após o surgimento em 2006 como um meio de compartilhar a vida/rotina para as pessoas, as streams rapidamente se popularizaram entre os gamers com a intenção de transmitir jogatinas para o público em uma relação mais interativa entre jogador e telespectador.

Atualmente, uma das principais plataformas, a Twitch, tem cerca de 15 milhões de usuários ativos diariamente. Tal popularidade está relacionada a diferentes fatores, a exemplo do fato de se afastar dos modos tradicionais de transmissão, como os canais de televisão, dando espaço à crescente demanda dos esportes eletrônicos por um lugar de destaque e, com essa nova modalidade, a oportunidade de pessoas crescerem nesse meio. O streamer Gaules, ex-jogador profissional de Counter-Strike, viu no segmento uma forma de reconstruir sua vida por meio da transmissão de campeonatos, com uma forte interação com seu público, chamado carinhosamente de “Tribo”, fugindo do padrão de transmissão com narração, priorizando os comentários e a torcida durante o jogo junto com os telespectadores - algo impensável quando se fala em outros meios de comunicação.

Logo da Twitch - Fonte: Twitter.com

No momento atual, a plataforma não se baseia somente na transmissão de e-sports, expandindo-se para os esportes tradicionais. O já citado streamer Gaules adquiriu recentemente, em maio de 2021, os direitos de transmissão dos playoffs da NBA. Por não ser um esporte tão popular no Brasil e também pelo fato do público alvo das streams ser o jovem, a transmissão da NBA surge como uma forma de popularização do basquete no Brasil.

Consequentemente, as streams, mais populares na Twitch, mas que também ocorrem no Facebook e Youtube, são um importante meio alternativo de transmissão, dando visibilidade para os e-sports e também para pessoas não tão conhecidas, que não teriam espaço nos meios tradicionais de comunicação.

Contudo, esse crescimento da plataforma traz polêmicas. O surgimento de novas categorias de entretenimento não relacionadas ao e-sports são um embate com o público, como a categoria lançada em 2021 “Pools, Hot Tubs, and Beaches (Piscinas, banheiras aquecidas e praias)”, que basicamente são pessoas transmitindo a si próprias e criando conteúdo a partir dessa categoria. No entanto, é nítido que abre-se o espaço para a criação de conteúdo com conotação sexual. Para barrar e diminuir esse tipo de conteúdo, a Twitch proibiu a monetização de anúncios para essa categoria, mas isso não impediu o crescimento da mesma.

DIRETRIZES DA COMUNIDADE E BANIMENTOS

Com base nas polêmicas envolvendo a plataforma, torna-se importante destacar as regras que regulam o ambiente das livestreams e sua importância na criação de um cenário agradável. A Twitch possui uma área dedicada a especificar as Diretrizes da Comunidade. Sobre esse ponto, a empresa apresenta uma política firme quanto ao descumprimento de certas regras, como podemos ver na citação a seguir, retirada de sua própria página: “Para proteger a integridade da nossa comunidade, nós da Twitch, como prestadores de serviço, reservamo-nos o direito de suspender qualquer conta, a qualquer momento, por qualquer conduta que consideremos inadequada ou nociva. Tais ações podem incluir: remoção de conteúdo, aviso de infração e/ou suspensão da conta.”.

Ainda na área de Diretrizes da Comunidade, a plataforma lista uma série de exemplos de comportamentos considerados inadequados ou nocivos, entre eles observa-se: a infração de leis, tentativas de burlar suspensões, ameaças ou violência a indivíduos ou a grupos, discursos de ódio, assédio, nudez e pornografia, compartilhamento não autorizado de informações privadas e, por fim, a infração de direitos de propriedade intelectual.

Em alguns casos é fácil reconhecer quais diretrizes foram rompidas pelo autor que recebe a punição. Um exemplo é o recente caso do streamer argentino “Hastad”, que teve sua conta suspensa indefinidamente na plataforma Twitch no dia 18 de junho após viralizar na internet um trecho de sua stream do jogo Valorant, onde o mesmo aparece utilizando um termo racista para ofender outro jogador. Fora essa conta inativa, o argentino possui também um canal no Youtube com atualmente 688 mil inscritos, e seus envios mais famosos atingem a marca dos 1 milhão de visualizadores. Hastad, por meio de sua conta no Twitter, pediu desculpas e se mostrou arrependido pela atitude racista.

Hernan “Hastad” Klingler - Fonte: Uol.com

Em outros casos, no entanto, a punição recebida pode ser vista como uma medida injusta por parte da comunidade e dos streamers, como foi o caso da jogadora de Valorant da equipe INTZ, Taynah Yukimi, conhecida também como “Tayhuhu”, que recebeu uma suspensão por tempo indeterminado na Twitch no dia 1 de outubro de 2020. Taynah, por meio de seu Twitter, explicou o motivo do banimento com as seguintes palavras: “estava fazendo live tranquilo jogando, chegou o ifood tive que buscar e coloquei a comida no prato pra mim e pra minha filha, então quando eu voltei pra stream eu vi que ela estava interagindo com a live, de fone de ouvido e tudo. E tomei o ban.” A punição baseia-se no fato de que nos termos de serviço da plataforma, é especificado que menores de 13 anos não podem desfrutar dos serviços da Twitch sem a supervisão de responsáveis.

O problema, contudo, reside no fato que as livestreams são as únicas fontes de renda da jogadora da INTZ para ajudar sua família em crise financeira. Portanto, tendo em vista essa situação, uma grande parcela dos fãs e da comunidade, envolvendo até nomes famosos do cenário competitivo de e-sports, como o Gabriel “FalleN” Toledo (jogador de Counter-Strike mundialmente conhecido), mobilizaram-se nas redes sociais para mostrar sua insatisfação com a punição da streamer. Como resultado, no final de dezembro, a Twitch voltou atrás com a punição e removeu a suspensão de Taynah.

Taynah “Tayhuhu” Yukumi - Fonte: maisesports.com.br

Esse, contudo, não foi o único caso em que houve insatisfação por parte do streamer punido. No dia 9 de novembro de 2020, o craque do Paris Saint-Germain, Neymar, teve sua conta da Twitch suspensa por uma semana após acidentalmente vazar o número de telefone de seu colega de seleção, Richarlison. O incidente ocorreu em live na própria plataforma, quando o camisa 10 da seleção brasileira passava um trote para o colega e acidentalmente mostrou seu número para a câmera. A punição, contudo, foi encarada de forma descontraída pelo craque, sobretudo por durar apenas uma semana, e não por tempo indefinido como no caso de Taynah.

STREAMS: UMA NOVA FORMA DE INVESTIMENTO

Outro ponto relacionado com as livestreams é a necessidade de investimento de capital. De modo geral, a criação de conteúdo por meio de streams se mostra bastante acessível, podendo ser feita por meio de computadores, tablets e até mesmo celulares. Contudo, para aqueles que desejam se profissionalizar no meio, a situação se demonstra diferente. De acordo com Alan Ferreira, conhecido popularmente como Alanzoka e um dos principais streamers brasileiros na Twitch, sua profissão se assemelha a outras mais tradicionais na questão dos investimentos necessários. Para melhor esclarecer, ele realizou uma analogia a um profissional que trabalha em uma padaria: assim como um padeiro deve investir em insumos, melhorando a qualidade de seus pães e atraindo uma maior quantidade de clientes, streamers profissionais devem investir em seus equipamentos, proporcionando conteúdos de qualidade e criando maior engajamento. Dessa forma, é comum que o custo total dos equipamentos desses streamers, englobando itens como computadores, microfones, câmeras e sistemas de iluminação ultrapasse o valor de veículos populares novos.

Streamer e youtuber Alanzoka, com mais de 5 milhões de seguidores em seu canal na Twitch - Twitter.com

Além dos próprios streamers, com o crescimento e popularização das plataformas, as livestreams passaram a ser interpretadas como formas de investimento também para agentes externos.

Um primeiro destaque é em relação ao setor de varejistas, em especial os que comercializam produtos eletrônicos. Sob a perspectiva dessas empresas, realizar contratos de patrocínio com streamers e anunciar em livestreams se mostra financeiramente vantajoso, tanto pelo grande público com que eles se comunicam quanto pela própria característica desse público, o qual, estando inserido no contexto digital e de jogos eletrônicos, possui maior probabilidade de se interessar pelos produtos da empresa. Assim, é comum que essas companhias anunciem códigos de desconto ou promoções por tempo limitado por meio de livestreams.

Um segundo destaque é no que se refere às desenvolvedoras de jogos, principalmente em relação àquelas conhecidas como “indies”, caracterizadas pelo reduzido tamanho de equipes e pelo baixo orçamento. Pela ótica dessas desenvolvedoras, a presença de seus jogos em livestreams famosas gera grande visibilidade, o que não teriam caso não estivessem presentes nessas plataformas. Um exemplo desse cenário foi o jogo Among Us: lançado em 2018, ganhou popularidade principalmente em 2020, após se tornar um fenômeno entre os grandes streamers da Twitch. Como consequência desse sucesso, no ano passado, o jogo ultrapassou a marca de 100 milhões de downloads em todo o mundo.

Among Us, um fenômeno em 2020 - Fonte: Epicgames.com

NEM TUDO SÃO FLORES

De uns anos para cá, o Facebook - ou mais especificamente a seção Facebook Gaming - tem investido continuamente na área dos e-games para rivalizar com o YouTube e a Twitch (considerada a pioneira no mercado de transmissão de jogos online). O grande problema da carreira “streamer” está nas incertezas da área: sem saber o dia de amanhã, há uma necessidade de atualização quase instantânea para acompanhar o mercado.

Setup do streamer Alanzoka avaliado em mais de R$27.182 - Fonte: Techtudo.com

Ressalta-se também os longos períodos de tempo gastos para um bom desenvolvimento. Exemplo disso é Milena Bragatti, mais conhecida como MenyeB, que começou a “streamar” há oito meses e tem uma média de 100 horas de live por cada 30 dias fora os investimentos em equipamentos de imagem, som e conteúdo. Apesar de parecer uma “carreira promissora”, é necessário realçar os custos envolvidos no processo.

EM SUMA…

Portanto, é visível a grande importância das streams na atualidade. Um mercado inicialmente limitado pelo meio gamer, mas que já se expande para os esportes tradicionais (futebol, basquete), e ainda tem muito potencial para crescer. No entanto, dada sua liberdade para criação de conteúdo por parte do público, muitas das vezes os telespectadores, em sua ampla maioria menores de idade e jovens, podem estar expostos a conteúdos inapropriados ou que ensinem comportamentos errados, como a toxicidade nos jogos online.

Contudo, como um modo de deixar as plataformas livres de conteúdos ruins, as já mencionadas diretrizes de comportamento podem punir e, ao mesmo tempo, prejudicar gravemente pessoas por erros e enganos. Consequentemente, dado que é encarado como um meio profissional por diversas pessoas, acaba por comprometer a fonte de renda destas.

Ademais, em relação a essa questão da profissionalização, notou-se um maior investimento para a realização das transmissões, algo que está distante da realidade da maioria dos brasileiros. Assim como no futebol, no qual jovens tentam a carreira por ser um meio “fácil” para mudar de vida e ascender financeiramente, o mercado de streams também influencia pessoas a ter esse sonho.

Porém, dado os investimentos cada vez maiores para as transmissões, em conjunto com a alta concorrência nesse mercado (com a necessidade de dedicação integral à criação de conteúdos), o sucesso e enriquecimento rápido nessa profissão se tornam, possivelmente, cada vez mais improváveis de ocorrer.

FONTES:

Gaules fará transmissões de partidas dos playoffs da NBA

Twitch cria categoria para streams em banheiras e 350 novas tags

Diretrizes da Comunidade: Twitch

Matéria sobre o banimento de Hastad

Matéria sobre o banimento de Taynah Yukimi

Matéria sobre o banimento de Neymar

Streamer: que profissão é essa que a pessoa fica o dia todinho jogando?

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A FEA Sports Business é uma entidade universitária da FEA USP, que tem como objetivo fazer parte da mudança e da profissionalização da gestão esportiva no país.

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